O Sal

"Veja, filho, o sal."

"E o que aquela montanha de sal tem demais?"

"O sal pode nos dar e tirar a vida. Pode trazer gosto ou deixar insosso. Pode ser base ou incremento. E não passa de um pó branco. Somos ricos em sal. Ricos, mas pobres. Pobres, por não sabermos da riqueza diante de nossos olhos."

Como fazer contas

Já se foi o tempo daquele menino já magro e agitado
Ele agora é mais magro, e tenta conter seu entusiasmo

Ele trabalha, se submete, labuta
mas não sabe como será o dia de amanhã.

Todos os dias nós nos matamos
Para vivermos de novo
E ele espera um dia, só um dia, pelo menos,
não se matar de noite

Os espelhos mostram o rosto de alguém que trabalha muito
E deveria trabalhar mais
vivemos para trabalhar ou trabalhamos para viver?

Ele descosturou sua dor
Numa série infinita de nós e laços
E depois integrou-os todos
Em alguém feliz, mas que trabalha.

Pode faltar reconhecimento,
quem irá ver o que está por detrás dos seus olhos vermelhos?

Ele tem metas, e mesmo ferido, irá cumpri-las

Sem metas um homem não é nada
Sem contas um mundo é nada

Culpa da vida Culpa da vida

Muitos dizem que o homem é o que tem. Outros tantos afirmam que o mesmo se define a partir do que é. Nesse teatro, do que importam as máscaras e os adereços? Na grande obra da vida, é o que se faz que forma o homem. Essa é uma verdade tão sutil, mas tão tangível, que talvez seja a menos percebida no cotidiano.


Valorizam-se muito os empreendedores. E, pelo menos aqui, não se pode criticá-los. Eles foram corajosos o suficiente para, de uma forma ou outra, por caminhos tortuosos que o tempo nos há imposto, escreverem o livro de suas vidas. E o preço, invariavelmente, é alto demais. Porque são culpados.


A humanidade criou um sistema tão fantástico, tão inteligente de vida em sociedade, que, hoje, quem faz, tem culpa. Os jornais nos transmitem isso toda hora, todo dia. Criam monstros que, num acesso infantil de loucura, tiraram a vida de outrem. Pior, podem destruir a vida de alguém que simplesmente errou.


Erros existem, e devem ser reparados. Alguns podem dizer que há alguns imperdoáveis. Mas os que o dizem não são capazes de se perdoarem. Procura-se a culpa de todos os males, de todas as mazelas, mas se esquecem de que apontar culpados não vai resolver o problema. Infelizmente, a arte do diálogo cada vez mais é suprimida, apagada a todo o custo. Vai sumindo a partir das famílias.


Sobram meios e interlocutores, mas falta, e muito, conteúdo. E sem isso, como será possível uma conversa produtiva? Não compartilhando os erros uns dos outros, eles se sucedem cada vez mais, numa escala crescente de gravidade. As pessoas querem se desvencilhar ou unir-se uma à carne da outra, numa costura macabra. Daí só restam feridas, e que doem e custam a sarar.


Falta compreensão, vive-se infelizmente numa cultura de culpados e neutros. E os neutros, esses sempre estão vencendo. E o limite de um ultrapassa o do outro, numa cadeia que só vai parar quando for quebrado o limite do primeiro. Um ciclo sem fim, de destruição e dor.


É, talvez seja o tempo de se calar, de se amordaçar, de se anular. Queimar a sua essência na Quarta-feira de Cinzas e comprar uma máscara. Até que elas estão ai aos montes, umas largadas ao chão. Porque dói ser culpado de uma coisa que se tentou evitar.

Morbidus Operandi

Era um dia perfeito. Nunca pensei que pudesse viver um momento assim. A beleza, a exuberância...Parecia uma natureza morta de minha vida.

Finalmente aquele seria o último dia em que usaria aquele transporte. Desgraça de minhas manhãs e tardes. Incrível, porém, é como nós desenvolvemos afeto por tudo aquilo que nos maltrata.

Fui escravo e virei capataz. Isso era uma certeza comparativa. O que, talvez,  nunca deixei de ser é ser nego. Um nego que se nega. Um nego que açoita outros negos.

Não, amigo, estava numa estação de trem do século XXI. O estado era assim: a pintura era nova, a estrutura, velha. Sentei, olhei meu terno, minhas abotoaduras. Agora eu era executivo, eu fazia, eu tinha poder para tanto.

Quando entrei, sentei. Os outros negos, mesmo velho, aleijado, mulher ou criança, eu me negava a dar o meu lugar. A porta branca se negava a fechar. De tanto negar, escurecia. Os sinais anunciavam: a viagem seria longa.

Pessoas liam, pessoas conversavam, pessoas batiam palmas. Eu permanecia estático. Pensava. Não era lugar de agir. Não havia como agir. Era o último dia de uma vida. Hoje é outra existência. Eu abri uma porta, entrei, e a mesma tinha se fechado atrás de mim.

O celular, esse patrão me chamava, gritava. Era do trabalho. Sempre exigia mais. De mim. De todos. Agora, eu também queria mais.

Ainda me lembro daquele dia moreno, eu olhando nas vitrines verde-avermelhadas. O progresso, le maxime fashion au Paris, o status, the edge of glory. Parei. Era pobre. Era a minha realidade, e pobreza nunca inspira felicidade.

Hoje, eu compro a minha felicidade. Aspiro-a, acelero-a, como-a, bebo-a. Porque, sem dinheiro hoje, não dá pra ser feliz, hoje. 

Ponho o fone no ouvido. No tocador, tudo organizado pela máquina-artista, ou artista-máquina, não sei. A vida ainda não encontrou a resposta. Mas você se lembra do Scorpions? Eu estava escutando. Tão bom quanto a passagem dos bons tempos. Mas tudo é morto.

Um aperto, um desrritmo na bateria. Hora de trocar a faixa. Alguém gritava que o fim estava próximo. Não, o fim está aqui.

A viagem chegava ao fim. Estava inebriado de felicidade. Cara, é a última vez! Vejo um homem, um senhor feliz, mas com seu corpo destruído. Faltavam dentes, e juízo. Vejo um homem, um garoto sério, mas com seu corpo perfeito. Sobravam-lhe dentes e juízo. O que é, então, a felicidade?

E o final da linha é o final do tudo. Cerro os olhos às verdades, mas também às mentiras. E paro. Ofego. Saio do trem de minha vida. Bem disse aquela mulher:

"Em país de Terceiro Mundo, quem anda sem identidade, descansa como indigente."

Fogo na nova cidade

Eu andava
Mas agora fujo
Via os prédios reluzirem
Observo sua desgraça nesse dia

Lembra-te do futuro
O novo empreendimento
Majestoso, majestade cidade
Reduzida a simples cinzas

Estou aqui, no fim
E que agora é um (novo) começo
Tantos meios perdidos
Uma crença perdida
Uma civilização perdida

Mas sim, o fogo consumiu
Tudo o que não construímos
Tudo o que não vivemos
Resta agora um coração perdido
E outro íntegro - o teu.

Essa jóia, tão bem trabalhada
Tornou-se excesso
Ocupou espaço demais
Sentimento que não tem palavras
Não há descrição

bsdaifgvjdkfdjkfvbhfhbgutcybchdwsnsomdsidshbchxnfjhbvfbvfuyvbir
ncunbeiwncieqwowobfveurcbufvbguhfrgmoxouhgurcmrcueiym8vf,ifvi
ndiusvnfdiubviuvuiwewbuoeriw remhgremmowve v rteg8remw rf8uge

Tinta que vai se esgotando,
Tornando-se dor
Tornando-se secura

fvur rnbir gjni jgnbgu irfgvj cv vfgb dff cdac  fvfa fd sdc cd sd a
_______________________________________________

Só nos restou a linha vazia
A primeira linha
De uma história
Que jamais será contada.



Sem estações

O dia pode estar lindo...
O Sol está floreando o dia
A brisa fresca está tentando me alegrar

Mas não
Tento te apagar
Tento respirar
Mas não consigo

Minha pele procura sentir
Mas não dá
As fotos de minhas mente
Escurecem
O fogo consome minhas imagens
De fora para dentro

E nada mais resta a não ser a brisa
A mesma que te trouxe a mim
E que agora procura afastar-me

A Maçã Descartável

Eu fui usado
Eu estou em uso
Eu serei abusado

O silêncio impera
Sagrado silêncio da razão
Enquanto nós os ouvimos

Nisso, meu amor próprio
Cai à guisa da gravidade
Piedosa irmã do silêncio
Como a maçã - essa de falsa beleza
Que da árvore cai.
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