Retrato

Essas são simples palavras, de alguém que nada conhece da vida, e nem nunca a conhecerá tão bem quanto o quer. É uma das minhas primeiras experiêcnias na poesia, forma tão nova e desconhecida que surge, e pulsa, e clama, de forma inesperada. É simplesmente algo que ainda não domino.

Estava cercado de caixas
vendo fotos, num vai-e-vem
como o vento que sopra nas faces
brancas e encardidas pela desatenção,
pelo descuido daquele que lhes escreve.
Pensei nas fotos minhas,
sorrisos e olhos congelados no papel
as emoções tão inexistentes.
Pensei que nem fosse eu ali,
na realidade, em nenhuma foto
senti-me tão autêntico
quanto na minha vida
nem na infância minhas fotos
eram fidedignas a minha 'idion'.
Quem são esses,
os sorrisos que rasgam o meu rosto
cheio de realidade,
acostumado com a vida,
essa filha-da-puta
que ora nos dá flores,
ora nos dá desgostos vários?
São retratos, falsos pedaços do Eu,
perfeitamente rasgáveis;
tenho certeza de que, há trinta anos,
se não fossem digitalizados os malditos,
os veria cheios da marcas das traças.
O retrato, com um rosto bem jovem, bem feliz,
e as mãos que o segurariam,
enrugadas pelo trabalho
e com o manejo
daquelas curvas sensuais, inconstantes
arredias como sua dona.
Pelas mãos, observo tudo o que veio antes
Todas as alegrias,
desilusões,
tristezas,
encontros.
Vi a vida,
vi a morte,
vi a ressureição,
vi a felicidade
vi o prazer momentâneo.
Tudo isso, porém,
penetrou em mim,
de forma tão profunda
mais profunda que todo o meu
montante de retratos.

Brasília: A Cidade da Esperança?

Nos últimos dias, com a chegada do Carnaval, a gente começa a saber melhor sobre os sambas-enredo que as escolas apresentarão. Uma escola aqui do Rio, e, coincidentemente, uma de São Paulo, vão homenagear os 50 anos de Brasília. Tudo isso vai ser financiado com o dinheiro do Distrito Federal, arrecadado do povo, que às vezes com muito esforço o faz. Paralelamente a isso, vemos, em todos os meios midiáticos, o escândalo da corrupção, no mesmo governo que financia desfiles pomposos. Caso esse, que culminou na prisão do próprio governador do DF. Aliás, parece que a relativamente curta história de Brasília é tão podre que nem há meios de esconder tanta impureza.
A construção de Brasília, poucos sabem, foi conjecturada muito antes da independência brasileira. Para se ter noção, uma das intenções dos Inconfidentes mineiros era centralizar a administração do país, que seria criado por eles. Desbravadores, financiados pelo governo imperial, iam até o Planalto Central, então no meio do nada, onde pouquíssimos índios habitavam, para provar que lá era o local ideal pro governo, sustentando um ideal, e não uma realidade.
O mirabolante plano tomou melhor forma na proclamação da república. Os mesmos militares parnasos e sonhadores, que utilizaram de um falso argumento pra, na verdade, aplicar um golpe político no Brasil, lotearam a área onde hoje existe Brasília e prometeram construi-la, pra integrar o interior do Brasil às áreas que eram mais dinâmicas economicamente. O único problema é que a nossa recém-nascida república tinha os políticos mais mentirosos e corruptos da história. Como diria nosso estimado presidente: "Nunca, na história desse país, houve uma corja tão forte de ladrões políticos." A sua desonestidade era tal que dá-me incrível repugnância ao lembrar das marmotas nas eleições, dos currais eleitorais, dos analfabetos funcionais, que somente eram ensinados a ler pra votar em algum candidato. Enfim, só pelos seguintes fatos, já deu pra notar que essa promessa ficou no papel, como muitas ainda hoje.
Então, chega Juscelino, nosso grande demagogo, que querendo impressionar o povo, decide tirar do papel essa idéia. Porém, o fez do nada. Simplesmente, não havia estradas pra lá, nem mão-de-obra no local demarcado. Levou tudo, desde material de construção, provavelmente já superfaturado, de avião, e mandou trazer uma cambada de nordestinos miseráveis, que ainda se orgulham por serem chamados de calangos.
Depois de gastar cinco anos construindo a cidade, toda num estilo modernista ou futurista, sobre bases podres, sobre os cadáveres dos calangos, gastando dinheiro até das reservas do país, inauguraram Brasília, no mesmo dia da morte de Tiradentes.
Voltemos ao dias de hoje. Visitei Brasília há algum tempo, e vi quão moderna a cidade é. Acontece que é impossível você andar pela cidade sem carro, o que empesteia a cidade com os conhecidíssimos Gás Carbônico e Dióxidos de Enxofre e Nitrogênio, enchendo nossos pulmões de fuligem, só que não misturados à umidade, já estamos no meio da América do Sul e num planalto de grande altitude. Observamos o centro do Distrito Federal, ou seja, Brasília, pujante, com seu povo jogando dinheiro fora, e o seu redor, miserável. É isso que agrava as nossas desigualdades sociais.
Isso me lembra um santo italiano, Dom Bosco, que é venerado em Brasília, por ter dito que sonhou com uma terra situada entre os paralelos 15 e 20 Sul, rica como a nossa capital. Se ele estivesse vivo, ou, se pelo menos, tivesse algum tipo de contato com esse santo, perguntar-lhe-ia se ele viu o seu entorno ou se verificou a existência de tanto dinheiro. Sim, porque isso ainda é uma dúvida entre todos os cidadãos brasileiros.
O Carnaval já começou e, com eles, os desfiles. A minha esperança é que a linguagem do dessa festa carioca, conhecida pela sua riqueza e incrível subjetividade, seja capaz de transmitir não só a beleza da capital do futuro, mas sim a sua verdade. Por último, dou a Brasília meus parabéns pelos seus cinquenta anos, de corrupção, egoísmo, materialismo e exclusão social.

Coisa Pública

Começo mais essa postagem com uma modificação no meu habitual perfil. Fiz dezesseis anos, e com isso, novas responsabilidades batem à minha porta. Segundo as leis brasileiras, agora eu já posso, facultativamente, votar. Mas aí eu comecei a pensar sobre o que seria o ato de votar. Observei que, estranhamente, a interpretação dada a essa ação pode adquirir diversos significados, conforme a intenção daquele que pensa.
Alguns muitos levam esse termo pro simples ato de votar. É como se somente fosse uma festa, ou um dia diferente, simplesmente. Pensa-se somente no momento, não se fazem grandes projeções, nem pequenas que sejam, sobre o que aquilo poderá desencadear em nossas vidas. O cotidiano apressado, que não permite tempo hábil para o bem pensar, além da desestimulação a esse, contribui pro agravamento desse problema.
Se bem que, não é mentira pra ninguém que o povo brasileiro sempre serviu de curral eleitoral. Os ufanistas que me perdoem, mas essa é uma verdade crucial. Nós sempre fomos treinados pra não nos importarmos com a política verdadeira, desde o berço. Quando a república brasileira foi fundada, o povão nem tinha noção do que estava acontecendo. Mal sabiam eles que aquilo era um golpe sujo dos militares, que aos poucos foi abrandado pra uma passagem dos mais destemidos, daqueles que queriam inovar e modernizar o Brasil. Mas nada disso ocorreu.
O problema fundamental, e que muitos poucos chegam a tangenciar tal questão, é sobre o que se define como cidadania. O estranho é que essa palavra já é usada há uns 2500 anos. Sempre foi puxada pro significado que proporcionasse o poder a poucos. Em Atenas e Roma, era restrita aos homens maiores de 21 anos e nascidos nessas cidades, além de serem poderosos, o que limitava a porcentagem de eleitores a menos de 10% da população. Depois das revoluções capitalistas, o voto, durante muitos anos, esteve nas mãos daqueles que ganhavam mais. O cúmulo dessa situação quase ocorreu no Brasil, em que se projetava considerar como eleitores aqueles que tivessem um número fixo de alqueires de mandioca. Por sorte, nosso primeiro ditador, Pedro I, não permitiu tal devaneio dos nossos "Reis da Cocada Preta".
Hoje, as pessoas pensam que, pra serem cidadãs, basta ter o direito a voto. Mesmo depois de tantas provas que mostram o significado acima, desde a origem da palavra, prefiro usar a minha acepção pra tal termo. Cidadania significa participar dos fatos ocorrentes na comunidade onde se vive, tentar resolvê-los, procurando primeiramente as nossas autoridades. Mas isso é utópico demais, já que nunca vi nenhum político que atendesse prioritariamente algum pedido da comunidade fora do período de eleição. Logo, devemos partir ao plano B.
Se não adiantar o pacífico, por que não tentar o mais ousado? Concordo que sou pacifista, procuraria negociar antes de atacar, mas acho que em muitas situações, poderíamos utilizar da nossa união pra promovermos protestos, mesmo que sejam pacíficos. Exemplos não faltam; basta lembrar de Gandhi. Mas esqueci que muitos preferem não pensar profundamente, então nem adiantaria. Mas, certamente há uma arma melhor, e tá sempre em nossas mãos.
É o direito de voto, aquele que confirma, e não configura, a cidadania. Então, nesse ano de eleição, em que provavelmente irei votar, vamos nos lembrar de uma coisa: voto consciente é o que há.

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