Um Elogio à Caretice

 

Depois de alguns  dias sem ter ideia alguma do que postar, sem a miníma criatividade e o máximo da preguiça comum a esse péssimo mês que se chama Janeiro, encarei uma coisa que existe em mim, mas eu não queria admitir.
Infelizmente, você, caro leitor, deve achar suuper chato as minhas divagações, o meu detalhismo doentio. E para sua imensa satisfação, você terá mais uma dose dessas minhas qualidades, ou seriam defeitos?
Ainda me lembro de uma música da Legião Urbana. "A Dança". Antes que isso pareça nostálgico, e pode acreditar que não é, vou dar um ctrl+v nuns trechinhos interessantes, isso se o Writer permitir.

"Você é tão moderno
Se acha tão moderno
Mas é igual a seus pais"

Enfim, depois desse momento cultural, comecei a me tocar de algumas coisas que vem acontecendo e que a todo tempo me fazem parecer no tempo da minha avó. Devemos, é claro, agradecer à mídia, mas isso é assunto para outro post.
Nem precisa muita pesquisa pra verificar isso. Na televisão, na internet, nos realities shows, o que você mais vê são assuntos escabrosos que mostram o quanto somos moderninhos. Vamos passar pelo melhor programa do que a estatística do Ibope chama de "Classe C", o terror das zelites.
Ninguém duvida do poder do BBB, quer dizer Boninho, Bial e Babacas. Aí vem essa gente, querendo impressinar, o marketing social e outros papos que só conseguem enrolar perua hipnotizada. Já não bastasse a pasmaceira de botar um drag queen, uma biba pupurinada, um homófobo do Terreirão e uma lésbica gostosa em 2010, decidiram pôr um homem que fez uma cirurgia de mudança de sexo.
Passado o susto pré-BBB com os boatos espalhados pela própria emissora, a mesma decidiu esfriar o caldeirão. Tiveram o desplante de fazer uma reportagem com a "macharada" de Realengo, do mesmo bairro do cidadão (digo, da cidadã). Disseram que adoravam a moça, que era gostosa, mesmo sendo cópia do original. Pegariam ela, com certeza!! Mas seria verdade? Eu acho que não, tanto que ela foi a primeira a ser dispensada da "casa"
Não que eu seja favorável a homofobia, mas não seria estranho, a meu ver, reações contrárias aos transexuais. Ainda é uma coisa bizarra, até mesmo nojento. Entendam, não sou favorável à Eugenia, nem coisa parecida. Mas ainda não consigo chegar a esse nível de liberdade. Mas pra alguma coisa serviu esse causo que ainda tá esquentando as conversas fúteis. Não, não foi pra combater a homofobia, longe disso. Só mostrou o quanto ainda somos caretas, o quanto ainda estamos no início do século XX.
Pior é perceber o quanto isso influencia. Escolhemos para governar pessoas antenadas com os valores dessa época, vivemos com pensamentos e princípios de economia que lembram do que os nossos bisavós faziam. Tenho certeza que muita gente ainda guarda dinheiro debaixo do colchão. Até mesmo nossa expectativa pra velhice é igual: aquela visão deprimente dos velhos encostados no sofá, sendo um encosto pros filhos e netos.
Os Estatutos mostram isso. Como consumidores, infelizmente, a tendência é inversa. Somos cada vez menos espertos, e tem gente que xinga judeu e sírio-libanês pela sua capacidade de pechinchar, prática cada vez menos importante, pois o que vale é o orgulho que temos ao engolir os preços dos presentes de Natal lá nas alturas. Nos resta a compra a prazo. A preocupação com o meio ambiente não passa de balela e engodo, pois ainda não nos preocupamos com a desconhecida Amazônia. E ainda nos espantamos com as chuvas de Verão!
Grosso modo, até tentamos ser modernos, mas ainda somos tão caretas quanto as carolas e os pudicos.


Indiferença

A maior praga humana
A morte de qualquer mortal
O silêncio dos humildes
A lama que inunda um espírito luminoso

Pobre aquela alma que lamenta
Na profundidade da sua ignorância pueril
Como, boba e tola menina, pudeste acreditar
Nos seus pés haveria um pedestal?

Mas a dor que sentes é a mesma que senti
Em dias menos quentes
Em tardes mais entediantes

Tempos imemoriais
Tempos em que os italiotas
Brincavam de ser gregos

Mas não sabiam da humanidade
Ela está mais além
de duas quartas e duas terças
E toda a sua teoria, toda a sua métrica
Foi lançada aos porcos
Tesouro inútil, enlamaçado na sua lama,
Minha madama
Prefiro escrever com essa mão limpa e alva
Amar-te e quebrar essas amarras do passado
Erga-te, levanta-te, anda:
Venha, dê as suas mãos lavadas em chorume
A esse ser indigno de atenção.

-------------------------------------------------------------------------------------------------
Perdoem-me a demora, foi questão de inspiração. Baixei um álbum horrível do Gene Loves Jezebel, The House Of Dolls, mas isso é pra outro post. Feliz 2011, de acordo com suas interpretações.

Nada de Diferente em Dezembro

"É estranho quando chegam esses dias. O mundo todo parece eufórico, época de muitos nas ruas. Andam em seus passos rápidos e frívolos em busca de várias coisas. Eu agora, velho de guerra, prefiro assistir. Já passei por tantos anos, que só me resta ficar sentado no banquinho do shopping enquanto meus filhos e netos ficam andando por aí. E eu lá, impotente e esquecido, durante horas sentado, nem podendo levantar pra que ninguém tome o meu lugar. Todos homens cansados de suas respectivas esposas neuróticas.
Ainda me lembro dos meus tempos de falsa inocência. Era pobre, logo era meio difícil conseguir ganhar algum presente. Depois que eu saía da escola, passava por aquelas lojas recém-chegadas dos Estados Unidos. Era um mundo mágico, fantástico. As luzes amplas, que destacavam os produtos de maneira tal que nos deixava de olhos arregalados. Naqueles dias, porém, umas luzinhas se destacavam. Eram pequenininhas e coloridas, acendiam e apagavam, sincronicamente. No meio do estabelecimento, uma árvore diferente. Nunca tinha visto aquilo antes. Toda verde-escura, sem flores, alta, imponente. O tronco e os galhos, de escuros que eram, pareciam de uma árvore morta. Logo eu, acostumado às árvores daqui, que no verão dão frutas suculentas e cheias de cor, dando um imenso prazer de subi-las e pegar aquelas delícias. Eu estava pra pegar uma daquelas folhinhas pequenas, coisa de criança, quando o funcionário me interrompeu:
- Ei, tá maluco, menino? Essa árvore é importada!
Outra coisa desconhecida. Achava aquela loja cheia de gente arrogante, mas a beleza daquilo tudo me impressionava. Ele continuou:
- É, menino, isso é um pinheiro. Vem lá do estrangeiro. Lá faz mais frio que aqui.
- Mas é sem graça, só tem verde nessa árvore. - Eu repliquei.
- Deixa eu te contar uma história. O Natal é uma festa de tanta magia. É uma época em que as pessoas tem algum tempo pra pensar melhor na vida. Elas ganham alguns dias de descanso, e em troca ganham mais dinheiro. Aí elas se presenteiam, pra serem mais generosas. Falando em presente, eu já te mostrei esse suéter? Um sucesso. Tudo bem, estamos no verão, mas é agora que é bom para garantir os agasalhos, sabemos que o inverno no próximo ano vai ser pesado. O clima, né? Tá uma pechincha, e vem do mesmo lugar que esse pinheiro. Esse é da moda, eu garanto....
- Não moço, eu não quero comprar....não tenho...
- Ah, não notei! Você ainda é uma criança. Tenho outra história pra te contar. A de Papai Noel.
- É mesmo? - Ele tinha me hipnotizado. Estava com os olhos vidrados nas palavras que ele estava usando. Todo aquele mundo me fascinava muito, e quanto mais soubesse dele, melhor.
- Sim. É um velhinho que vive no Pólo Norte, conhece? Ele é uma pessoa muito boa, rica e poderosa. Uma personalidade. Mas ele não aparece muito em público. Ele prefere fazer o bem pras crianças. Por isso, ele tem uma fábrica de brinquedos lá na casa dele, um mais bonito que o outro, você nem sabe como!
- E o que ele faz? Ele vende esses brinquedos?
Foi aí que o cara ficou balançado. Ele virou os olhos pro lado, meio que pedindo arrego. Mas nem tinha ligado, ele devia estar pensando.
- Ah, ele dá. Toda véspera de Natal, ele vai, vestido de cetim vermelho, esse pano aqui, na ponta de estoque...Ops, me distrai. Aí ele leva uma sacola enorme, cheia de brinquedos, dirige um trenó, tipo carro que as crianças do estrangeiro usam pra brincar na neve. Só que o trenó dele tem renas, um bicho que parece cavalo, mas com uns chifres enormes, que voam! Aí, ele pára em todas as casas do mundo, na noite de Natal. Ele desce pela chaminé...
- Chaminé?! Aqueles tubos que existem nos países frios? Mas aqui não tem disso! Como ele faz....
- Calma...ele entra...pela porta da frente! É isso! Pela porta da frente. Mas ele entra de fininho, pras crianças não acordarem. Aí ele deixa o presente ao pé da sua cama.
- Nossa, que legal!! Ele dá presente pra todas as crianças, né? - Era algo muito bom pra mim. Eu, então, receberia um presente. Aquilo era uma felicidade tão grande pra mim!!
- Não, na verdade, só as crianças comportadas que recebem a visita do bom velhinho. As más, ele só dá uma pedra de carvão. Mas agora, vá...e volte sempre, com seus pais, se eles quiserem comprar alguma coisa...
Minha felicidade era tão grande que passei aqueles dias do último mês do ano na maior ansiedade. Tudo esperando a noite do vigésimo quarto dia. Era tanta alegria que nem reparava o mundo a minha volta. Não tinha mais problemas em casa, na escola. Eu me esforçava pra ser um bom garoto, obediente. Minha mãe parece que percebeu a diferença, mesmo que não soubesse da história do tal Papai Noel.
Finalmente, na noite de natal, depois de uma ceia magrinha, reunindo toda a minha pequena família, fui pro meu quarto. Deitei na cama e fingi que estava dormindo. Queria por que queria ver o bom velhinho. Isso eram onze da noite. Onze e quinze e só a escuridão do quarto me acompanhava. Onze e meia e o vento lá fora uivava; era quente como costumava ser no verão. Quinze pra meia noite e ouvi alguns barulhos, vindos lá de fora. Não sabia o que era, nem me interessava. Devia ser o Papai Noel, por isso fui me preparando. Tudo pra ele chegar.
Até que chegou a meia noite. Silêncio. Dez minutos depois, eu acho, ouvi a porta se abrindo. Não era gordo como o do bom velhinho. Parecia estar tonto, quando finalmente ele achou o interruptor. Foi aí que eu o vi. Não o Papai Noel, mas o meu pai bêbado. Ele veio na minha direção e falou:
- Acorda, eu sei que você não tá dormindo! Você tá acreditando nessas baboseiras de Natal! Vamos! - Ele começou a me sacudir.
Eu não tinha outra opção a não ser abrir os olhos. E ele continuou a despejar:
- Olha...meu filho...não acredita nesse mundo....esse mundo cruel. Ser bom pra quê? Eu sou honesto, e olha onde estou? Pobre, sem dinheiro, sem como dar meios de minha família ser feliz.... - Ele começou a chorar intensamente. Acho que ele estava sendo sincero. Sabe, meu pai, como todos nós, homens, foi acostumado a ser introspectivo. Sabia que ele falava a verdade.
- E eu tenho um presente...pra você aprender como esse mundo é bom com você...peraí, deixa eu achar, tá aqui no bolso, mas qual deles....ah, sim, eu só tenho um....hum, deixa eu conseguir pegar....tá aqui!
Minha surpresa foi grande. Era uma pedra maciça de...carvão! Preto, puro, sujo. Fiquei surpreso com o presente, mas tive que pegar.
Pega logo, que me sujou todo já! Agora, vai, se vira, porque o mundo não é dos bonzinhos, porque eles vão pro céu!
E ele caiu duro de sono ali mesmo. Qual não foi a minha decepção com aquela cena toda! Surpresa, fascinação e entusiasmo que se transformaram em desânimo! E eu, que fui bobo, acreditei naquele velho bobo! Curvei-me a todos, deixei de ser eu mesmo, por causa de alguma coisa que eu queria muito, e talvez não fosse tão fantástica! Aquela foi, com certeza, uma das maiores lições da minha vida.
Foi aí que mergulhei na tal da igreja. Meus pais já iam, por ir, e eu era obrigado a participar de tudo. Quando menor, achava chato, e até maçante aquele discurso todo, aquelas histórias tão incompreensíveis, mas aí eu fui me interessando. Ouvi a história de Jesus. Senti a esperança voando sobre mim com o pregador, emanadas naquelas palavras. Comecei a crer cada vez mais, fazia mais e mais cursos, louvava, orava. Era a nova ovelha no rebanho daquele pastor bem vestido. Cada vez mais arrumado, nem parecia que ia envelhecendo. Todos se aconselhavam com ele. Cresci vendo aquele homem imponente ensinar a fórmula para um futuro melhor. Porém, sentia sempre a falta de algo. O quebra cabeças nunca estava completo. Quando eu acabei de completar a maioridade, fui falar com o chefe daquele rebanho do qual fazia parte:
- Senhor, como posso fazer pra chegar ao seu nível?
- Senhor não, já existe um, e ele já está lá em cima! HAHAHAHA - Ele gargalhava, como um demônio - Sabe, menino, pra ser igual a mim, você não tem que seguir tudo à risca, não! Se você quer ser bonito e rico você tem que esquecer essas histórias todas que eu te contei.
- E pra ser bom?
- Ah, aí seu caminho vai ser bem mais difícil! Tão complicado que só um conseguiu chegar lá. O resto que tentou, ninguém sabe, ninguém ouviu falar!!
Aquela foi a gota d'água. Deixei de ir àquele lugar toda semana. Senti-me enganado, esse é o termo certo. Foi tempo perdido, tudo perdido para o nada. Não que eu deixasse de acreditar em Jesus, mas achava que realmente a porta que nos ligava a ele era bastante estreita e o caminho, bem tortuoso.
Foi aí que tratei de crescer profissional e financeiramente. Agora, investia meu tempo em trabalho duro e em estudos. Conheci a velha história do mérito. Você é sortudo por tudo aquilo que faz, e blá blá blá. E não é que dei uma guinada? Investi, trabalhei duro, até que fiquei rico.
Foi aí que tudo mudou. E eu, que pensei que as coisas ficariam muito mais fáceis, vi que isso não era verdade. Novos desafios foram impostos a mim. E pior, esses se tornaram latentes, quase invisíveis, mas presentes. Era duro o desafio de tentar supor quem estava verdadeiramente ao meu lado ou quem queria puxar o meu tapete. E muitas das vezes, decepcionava-me com quem estava a minha volta, quando mostravam sua face mais real.
Depois de tanto procurar, e quase me arrepender da procura, me casei e tive minha família. Quando meus filhos eram pequenos, queria dizer a verdade: todos os presentes que eles recebessem iam ser de pessoas reais, e nada de Papai Noel! Eles saberiam desde a primeira infância, que isso era uma lenda, uma coisa falsa. Mas minha esposa não.
- Ah, amor, eles são crianças...
-Mas não! Criar eles numa mentira, pra quê? Todos que acreditam numa farsa têm uma decepção quando descobrem a verdade. As coisas não seriam melhores se tudo fosse às claras...?
- Ah, sem essa! Quem vai entregar os presentes vai ser o Papai Noel e pronto! Aliás, isso vai ajudar na interação das crianças na sociedade! Se elas não acreditarem, vão dizer que elas não tiveram infância! Olha, eu conheço uma amiga que tinha um primo que não conseguiu emprego por causa disso!!
- Por quê?
- Ah, o RH perguntou a ele se já tinha acreditado em Papai Noel. Ele riu e disse que não. Nem passou da primeira fase, coitado!
- Ué, mas qual o problema?! Coisa mais maluca!
- Ah, parece que disseram que era crítico demais, e coisa e tal....Podia ser uma péssima influência no meio de trabalho. Um extremista, coisa do tipo. Algo como um problema mental. Tem até nome técnico. Mas eu esqueci agora...
- Amor, isso é maluquice. São só analistas de RH. Vamos falar a verdade. Vai ser de fato o melhor para eles.
- Não, tá decidido! Eles vão acreditar em Papai Noel até quando quiserem! Eles devem ter o poder de auto-decisão!!
Foi aí que falei as últimas palavras que todo homem fala:
- Sim, amor! Assim seja feito!
Mentimos sim, e não só naquele ano. Em muitos outros, até eles notarem a mentirada em que eles foram idiotas de acreditar. Aí eles se tornaram essas pessoas frias que são em dia. E eu ainda me pergunto onde foi que eu errei.
Voltemos ao banco onde estava sentado, naquele shopping. Vi que, realmente, o Natal perdeu completamente seu sentido. Podia ser uma ótima festa, com sentimentos sinceros, mas não. A humanidade continua hipócrita, continua mentirosa, continua imunda, continua competitiva. Mensagem nenhuma poderia salvar as pessoas, por mais simples que seja. Falar de reforma íntima, infelizmente, é como falar de abstração. Todos continuam a pensar na casca. Falar em Jesus é algo extremo, ou oito, ou oitenta. Aceita-se os radicais, aqueles que querem que nós nos submetamos a Ele, como a um rei. Aceita-se também ignorar a sua pessoa, mas nunca tratá-lo como realmente foi. Sinceramente, depois dessa vida inteira, eu prefiro é ficar em silêncio. Por isso, essa vai ser a primeira e última vez que eu falarei."

Roman Daschow


A Onipotência da Verdade

"Havia já muitos anos em que me via dominado por aquele poder paralelo. Como morador do Alemão, na Penha, desde bebê, cresci dormindo embalado pelo som dos tiros. Quando moleque, jogava bola e soltava pipa, lá no alto do morro, no Coqueiral. Coisa de criança com infância bem aproveitada, como hoje não se vê. Pés descalços, alegria pura, um universo de terra, poeira, mato, manga tirada do pé...mas aí eles chegavam. Subiam com aquelas armas, aqueles trabucos colossais, coisa mesmo de guerrilha. A vó me gritava, dizendo pra ficar escondido em casa, senão os comunistas, aqueles monstros, iriam me comer.
Taí uma coisa que ficou estigmatizada em mim: Comando Vermelho. Naquela época, eles eram apenas um bando de facínoras comedores de crianças, que seguiam uma parada chamada Comunismo. Essa palavra era tabu, eu bem me lembro. Comunismo era sinônimo de CV. CV era hiperônimo de violência, truculência e chacina. Estes, por sua vez, eram hipônimos de lei. Meus pesadelos e os de meus amigos eram sobre toda essa realidade. Ninguém podia criticar, mencionar, comentar sobre o que a gente vivia. O governo das Laranjeiras, daquele palacete decadente perto da sede do Fluminense Football Club, nem nos dava atenção. Polícia Militar, nem chegava perto do pé do morro, na Grota.
A adolescência chegou, e o funk veio junto com ela. Aqueles monstros do CV prosperavam. Organizavam os bailes onde eu e meus colegas íamos, promoviam artistas, faziam festas beneficentes, colocavam garotinhas novinhas vindas do interior para servir de escravas sexuais, vendiam maconha, cocaína e cia. Desde aquela época, nossa comunidade era ponto turístico do Rio, assim como outras favelas. Os gringos que aqui vinham passavam assiduamente no baile e na boca de fumo, para, segundo a palavra deles, provar da melhor maconha do mundo, vinda diretamente da Colômbia, sem passar pelo estômago ou pelo ânus de um traficantezinho qualquer que viajava de avião. Era extremamente fácil identificá-los: eram os vermelhos, todos aqueles que estavam com a pele queimada de Sol, lábios inchados e inflamados e olhos avermelhados por causa da 'marola'.
Naquela idade, eu era revoltado com a vida que eu escolhi, ou a que fui destinado. Até hoje não sei qual dessas duas versões é real. Quase entrei nessa vida, mas aí via amigos meus morrendo cedo, branquelos da Zona Sul doentes irreversívelmente e o exército e a PM, que começaram a dar as caras por lá. Aí preferi ser um idiota, um trabalhador desse, só mais um Silva, um pai de família. Quando fiz dezoito, tive que me alistar no exército. Os traficantes exigiram um 'tributo': levar, a cada mês, um fuzil do exército. Pensam que era tarefa difícil? Nada, os próprios comandantes eram coniventes com o sistema.
Depois, virei pedreiro, trabalho que qualquer um podia fazer. E eu, somente com o fundamental concluído, de péssima escola pública da época do democrático regime militar, me adaptei facilmente ao resto que jogavam para mim todo final do mês. Eu e os companheiros ficávamos debaixo de Sol e de chuva, carregando tijolo, cimentando os futuros edifícios. No final da obra, a gente tava dispensado: aí vinha outra luta por um emprego que não iria durar pra sempre.
Naquela época, me casei e formei família. Na nossa 'casa', um quarto-e-sala de poucos metros quadrados e mal-conservado, desempregado, tive que pagar impostos. Mas não ao Estado, o que nada nos garantia, mas sim aos traficantes. Naqueles tempos, já existiam tantas facções, quadrilhas e subdivisões, que já nem sabia como diferenciá-las. Todas cobravam pela luz, gás, 'segurança' e até pela TV. Só nos restava pagar. Um dia, estava sem dinheiro, e devia aos traficantes. Em vez deles cortarem a luz, que já era ilegal na localidade onde morava, eles me levaram para o 'julgamento'.
Era noite quando voltava de casa, depois de mais um dia quente em que tentava achar desesperadamente um emprego. Encarei várias portas se fechando pra mim, com a voz severa, fria e dura constatando: "Você não tem experiência". Subia já as longas escadarias, ruas e vielas daquela comunidade, quando, num beco deserto, alguém veio em minha direção, olhando fixamente em mim. Dei alguns passos pra trás, mas alguém já tinha me pego. Após algum tempo desacordado, percebi que estava num local deserto, no meio da mata. Era um círculo de uma dúzia, assim acho, todos apontando as armas que tinham para mim. Entraram no meio dois homens, um com uma espécie de tocha e o outro aparentando ser o líder, dizendo:
- Estamos cansados de vagabundo que não paga as nossas taxas! Nós lhe damos conforto, segurança, ajuda nos momentos de necessidade, e é assim que você nos retribui? Você nunca dependeu do Comando pra sobreviver?
E eu:
- Sim, mas....estou procurando emprego, você sabe como é difícil né, nesses dias em que os ricaços não querem construir prédio...sou pedreiro. Por favor, me perdoem! Eu juro que vou pagar o que devo!
- Ha Ha! - Ria alto o chefe - Dá até pena de você, idiota! Devia acabar com a tua raça agora mesmo, mas tô vendo que não vale a pena esmagar um verme desprezível como você. Vai pra casa! Não olha pra trás!!
Cheguei em casa, mais humilhado que nunca. Não mencionei o ocorrido com minha esposa, então ela pensou que eu estava assim porque não consegui arranjar emprego. Já tínhamos dois filhos pequenos, e naqueles tempos, a gente vivia de favor, de doações. Quando fomos dormir, não consegui pregar o olho. Estava apavorado.
No dia seguinte, quando estávamos tomando um resto de café, entraram na minha casa. Era um garoto, um mensageiro do tráfico.
- Mané, vai presse endereço aí!
Minha esposa reparou a origem do rapaz e perguntou:
- Que isso, você está se envolvendo com o tráfico? Quantas vezes eu te falei, procura um emprego digno e honesto, é esse o jeito! Não tem esquemão, nem nada parecido!! Traficante não morre velho não!!
Decidi contar da história da conta e o julgamento do tráfico. Ela ficou preocupada. Resignada, abaixou a testa, aparentando estar vinte anos mais velha, e disse:
- É...então vai lá...não sabe o que é...boa sorte, vou rezar por você.
Lá fui eu, como um boi vai pro abatedouro. Quando cheguei lá, encontrei mais uns muitos homens, como eu. Um senhor de terno subiu à frente e falou:
- Olá, amigos. Sintam-se privilegiados. Vocês, sem nenhum tipo de processo seletivo, possuem um emprego definitivo na nossa construtora. Sabemos que o mercado imobiliário não está bem das pernas, mas um futuro novo vem pela frente. E vocês participarão disso!
Metade dessas palavras tinha jogado fora. Achei inútil o discurso do senhor sobre mercado imobiliário, algo totalmente desnecessário. Era o que achava na época. Pior foi a previsão dele, considerei muito piegas e sem sentido. Ainda mais para um trabalhador como eu, cujo maior foco encontra-se no presente. Mas aplaudimos, e comecei a trabalhar. Eram todas obras públicas. Minha empresa era marca registrada nesse tipo de obra. Construção e reforma de escola, hospital, administração pública, isso sem falar nos asfaltamentos que a gente fazia. Realmente, olhando pra trás, percebi que aquele engravatado sabia o que estava falando. Um presidente operário e sindicalista foi eleito e com ele veio uma preocupação maior com o povo pobre. Deu pra reformar meu barraco, comprar móveis novos, pensar no futuro do meu filho, fazer uns cursos gratuitos pra ajudar na minha profissão. Até minha mulher começou a trabalhar, fazendo um pouco de tudo. Meu sonho era fazer uma faculdade. Engenharia Civil, eu acho. Entrei num supletivo pra ver se conseguia terminar o ensino médio e recuperar o tempo perdido.
Mas então, quando pensávamos que todos estavam 'juntos', recuperando-se de quarenta anos de pleno abandono do poder federal, o tráfico ia se fortalecendo. Matavam todos aqueles que iam contra seus princípios, e também aqueles que mostravam os podres do seu esquema criminoso. Ainda tinham moradores apoiando esse bando, mas eles cada vez iam diminuindo. Pouco a pouco, fomos sendo picados pelo mosquito. Não o Aedes, mas sim pelo governo estadual.
Entrou há oito anos e era um baixinho. Invocado. O Rio estava num processo de 'limpeza': os focos de sujismundice do governo anterior eram desbaratados, limitando os antigos chefes a uma cidade, bem distante da capital. Naquela época, limpeza era sinônimo de trocar o sujo pelo mal-lavado. Saíam alguns poucos traficantes, e ia entrando os milicianos, horda cruenta de militares exploradores e hipócritas, que queriam criar o Estado dentro do Estado, em dimensões incomparáveis ao tráfico. Enquanto isso, na mídia, defendia-se os milicianos, de forma implícita. Todos queriam lavar com sangue o decadente tráfico. Fiquei sabendo que, nos países ricos, não se tinha esse tráfico. Era tudo feito a quantidades de formiga, bandinhos pequenos, sem armas, sem morte, sem disputa por poder.
Quando ocorria algum conflito, a PM entrava, atirando. Era a Tropa de Elite, osso duro de roer. Matava tudo o que via pela frente. Animal, bandido, trabalhador. Eram dias difíceis. Por um lado, o consumo, as contas, o crediário, a expectativa de entrar na classe média. Sim, aqui não parecia mais uma favela, um local de excluídos. Fomos elevados à condição de comunidade. Algumas se tornaram bairros longínquos. A TV, o rádio e o jornal decidiram começar a entrar na comunidade, conhecer sua cultura, suas vielas, seus prodígios.
Foi então que veio a UPP. Começou, por motivos logicamente óbvios, na Zona Sul. Foi aí que a mídia e a gringada não-viciada começou a tomar o Santa Marta. Ao governo, coube a missão de desfigurar aquele povo, transformando o morro em paraíso dos pobres da Zona Sul e ponto turístico. Deu tão certo que eles ampliaram. A coisa em si era simples, bastava pôr um mini-batalhão, chefiado pelo Estado, o qual, por sua vez, teria o domínio sobre a comunidade.
Foi aí que, em 2010, teve a guerra. Acompanhávamos, abestalhados, aquela bandidagem do morro fugindo em debandada, cheia de medinho. A imprensa mostrava aquilo como se fosse um épico, uma coisa brilhante. Num domingo, invadiram a comunidade. Era o Estado se impondo pela primeira vez na minha região. Foi bem ao estilo daquela guerrilha dos anos 70/80, mas bem pior e armada até os dentes. Em seis horas, puseram a bandeira do Brasil e do estado no topo da comunidade. Passei por lá, alguns dias depois. Era impressionante. Fazia muito tempo que eu não via aquela bandeira verde-e-amarela, desde aqueles tempos de ginásio, com hino toda segunda. Era linda. Me sentia cidadão.
E o ano terminou, e seis meses depois construíram umas UPP. Lindona, ocupava uma creche, que tinha sido desativada com esse objetivo. A polícia tomou conta do pedaço, dizia todo mundo. Ocasionalmente, invadiam algumas casas, à procura de coisas suspeitas, segundo eles, e destruíam todo o trabalho de anos para ficar pelo menos arrumadinha a casa. Acabavam com os móveis e os eletrodomésticos tão esforçadamente compradas no crediário das Casas Bahia, durante até mesmo dois anos inteiros. Roubavam dinheiro, por acharem suspeito. Quebravam lojas. E não adiantava reclamar, porque os que faziam isso eram só 0,01% do total da população. A gente se calou, engolindo aquele doce amargado pela língua do Estado.
Depois, minha vida fervilhou. Fiz técnico em Edificações, mas ainda não consegui fazer a tão sonhada faculdade. Quem sabe um dia? Tem agora esse ProUni e o FIES, mas o que me falta é o dinheiro. Ainda não tive coragem de fazer o ENEM. Se bem que dizem que é fácil, que chagam a colocar questões falando de vôlei e dança. Bem, fica pro futuro.
Fiquei ocupado, de 2010 até 2014, com comprar. O governo estadual decidiu me tirar, junto com outros tantos moradores, do morro. Diziam, parece, que era por causa do risco de deslizamento. Nunca aconteceu isso, mas mesmo assim, não me preocupei: aceitei aquela proposta na hora. Fui transferido para um conjunto residencial, com minha família, um ano depois. Foi um prédio construído muito rápido. Fui promovido a mestre de obras e ganhava bem mais do que antes. Para completar a mudança, comprei móveis novos, modernos, bonitos, todos no crediário. Meus filhos entraram na faculdade sem dificuldade, só no cursinho barato, em que eles aprenderam a ser gente culta, a ler 'boa revista' e a ter um 'bom gosto'.
Foi aí que percebi algo de errado. O apartamento, concluído tão rápido, tinha problemas estruturais bastante sérios. Material barato, constatei. Tive que comprar novos tijolos, para reformar a casa 'nova'. Fui acumulando dívidas, me enrolando e, quando me percebi, estava com o nome sujo. Abri o jornal de domingo, de onde vinham aquelas notícias maçantes sobre economia doméstica, defesa do consumidor. Algo que, infelizmente, se tornou difícil pra mim. Consegui limpar meu nome, com muita dificuldade. Foi aí que me tornei zura, daqueles que tentam segurar o dinheiro no bolso antes que ele se evapore naquelas belas igrejas que os engravatados fizeram de construir pela cidade inteira."
N.P.

Trinta anos. A casca mudou, ficou mais brilhante. Agora põem cera de carnaúba para que ela fique mais brilhante. Lançam remédio, fertilizante industrializado, batizam a fruta de conservantes, aromatizantes e outros 'antes'. A polpa da maçã, porém, continuou a mesma, amarelinha, porosa, suculenta, com aqueles carocinhos e o caule no seu eixo. Logo, nada mudou: assim que abrem a maçã, e a deixam exposta, ela escurece, perde o sabor e fica horrivelmente murcha. Os flagelados da cidade dos anos 80, tornaram-se alpinistas sociais, nova classe média, novo gado, agora consumidor. Tornaram-se cidadãos, mas com poder tão ínfimo, tão risível para os mais ricos. É essa a nossa nova sociedade.

Ruínas do Castelo

...E juramos amarmo-nos pra todo o sempre
Enternecidos, olho a olho, boca a boca
Naquele edifício
Alto, que as nuvens alcançava
E a divina força emitia suas vibrações
Caía um raio sempre que chovia

Nosso Dia assim foi
O céu chorou
Deus chorou
De tristeza e de emoção
Ao pacto parlado ratificarmos

Provei eu do teu proibido fruto
E tu, do meu
Fomos, assim, expulsos
Do paraíso chamado Inocência
Ato simples, que nós mesmos tornamos pecaminoso
Sujamo-nos e suicidamo-nos
Sentes a dor do amor
E digo-te: sou eu o culpado

Fui eu o raio e o cometa ardente
Quem esmagou nosso castelo de cartas
Incinerei nossas lembranças
Queimei o teu dedo com ferro
Ardente que foi, ainda tens a marca

Era ferido, e tornei-te mais uma
Dessas borralheiras que espalham o pó
De sua dor e da indiferença de que são dignas

O que agora fazer,
Acabaram-se as desculpas
Acabou-se a sacarose
Acabou-se a força de meus músculos
Acabou-se o sangue de teu corpo
Acabou-se a festa
Nem mais há um docinho de coco
E o amor, não se acabou
Simplesmente, pois, nunca existiu
Como a minha vida

A Roda do Desperdício

Desperdiçar. Essa foi uma ação que, ao longo da história, nunca teve um significado tão agravador. Possuía importância secundária. A literatura registra o uso desse termo nos romances, na perda de tempo. Sim, esse talvez tenha sido a primeva ideia de desperdício, tal como se o conhece atualmente. Talvez tenha sido a consciência Calvinista de ócio que nos tenha levado a esse estágio. Quem sabe, um desperdício aparentemente incômodo tornou-se a faísca para uma série de transformações que levaram a um desperdício bem maior e mais grave?
É preferível começar no Hoje. Daqui, desta estação, far-se-á uma volta. Muitos criticam esse modelo, porém dessa maneira pode-se estabelecer um paralelo entre esse ponto e o outro, lá atrás. A arte de desperdiçar é, atualmente, uma ciência latente, mas bem difundida. Basta reparar no cotidiano. Nas ruas, há grandes congestionamentos, com amplas emissões de óxidos de carbono, formadas por carros que possuem somente uma só pessoa. Nos lixões, enormes quantidades de produtos aproveitáveis, considerados lixo, só por serem velhos ou terem pequenos defeitos. Nos restaurantes, principalmente os de 'autosserviço', no final do dia, o que se vê são mesas e mais mesas repletas de pratos com restos de comida, às vezes intacta, por simplesmente o cliente reparar que colocou comida demais para as suas necessidades fisiológicas. Nos mercados, feiras livres, quitandas e comércios, o que mais sobra são produtos com partes 'ruins', que são jogados fora. No campo, empresas agrícolas, ao perceberem que a safra pode ultrapassar a capacidade de procura do consumidor, usam o excedente como adubo ou simplesmente as inutilizam, para simplesmente conter o preço. As residências, sobretudo as de classe média, têm uma coleção de celulares ainda utilizáveis e que estão guardados, parados como relíquias de um museu de coisas nem tão velhas. Como deu para ver, essas são sinais que atentam que algo está errado e compõem uma pequena parcela dos fatos relacionados a essa prática.
Num passado distante, lá na Idade das trevas dos europeus, situações como essa seriam consideradas pecados. A produção era tão minúscula que era mais aconselhável armazenar e estocar do que simplesmente jogar fora os produtos essenciais à vida. Possuía-se, sim, mais tempo livre. Mesmo que os camponeses fossem explorados pelos seus Senhores, a acomodação e o ócio deviam ser imensos, já que a reação a esse regime só ocorreu séculos depois. Não se deve desprezar a influência cultural da Igreja Católica, mas a acomodação e o imobilismo social resultavam dessas duas causas. Os dominates eram exemplos para os seus dominados. Nobres, além de alguns poucos momentos de guerra faustosamente mencionados como impossíveis aventuras e épicos pífios, eram eternos indolentes, dando ordens a todos os servos, que os serviam com prestação, mas sempre com folgas.
Até que veio a Revolução Comercial. As atividades financeiras, bancárias e comerciais registraram um renascimento inesperado, como uma fênix que surgiu das cinzas. As causas dessa dura transformação ainda não parecem bem claras, havendo confrontos entre os registros históricos de diversas regiões do hemisfério Norte. Saindo da historiografia, passamos ao conceito de ócio, que por sua vez determina o grau de desperdício. O feudalismo anterior, começou a dar espaço, aos poucos, ao artesanato citadino. Nessa fase, os artesãos tinham total controle sobre seu próprio trabalho, controlando o seu horário e o quantitativo na produção, o qual era bem parco. Logo, utilizavam baixa quantidade de matérias-primas, o que, na grande escala, não representava um grande desperdício. Os navios da época, muito lentos, aproveitavam já a energia eólica, não resultando em grandes degradações.
Com um pouco mais de tempo, os artesãos começaram a ser explorados por um grupo seleto de novos ricos, que os apinhavam em galpões, usando máquinas pouco elaboradas, mas que já facilitavam o trabalho e aumentavam a produção e a quantidade de matérias-primas extraídas. O metalismo presente nessa época resultavam numa das primeiras apresentações do que se considera atualmente como desperdício, vindo como uma forma de avareza dos Estados modernos. A pilhagem do ouro na América causou enormes danos ao meio-ambiente do continente, acoplando em si outros prejuízos, como mudanças nos ecossistemas e genocídio e processo de aculturamento das populações locais.
O acúmulo de metais preciosos auxiliou no processo de industrialização de partes restritas da Europa. A riqueza e, consequentemente, o poder acabaram sofrendo uma centralização maior do que na época anterior, tão combatida pelos movimentos iluministas do século XVIII. Nessa nova fase, a produção sofreu um incremento tão grande que a partir de então, as crises eram geradas pelo excesso de produtos no mercado, e não mais pela sua falta, como acontecia anteriormente. Tornou-se possível produzir uma quantidade imensa de produtos em um tempo relativamente pequeno. A ciência pulou do fundo do quintal, naquela casinha dos fundos mal estruturada, para enormes laboratórios com a infra-estrutura necessária e financiados pelos industriais daquela época. Não existia, naqueles tempos, o empecilho de fundo moral e religioso.
Todo esse ambiente permitiu a extração vultuosa de matérias-primas, em diversas partes do mundo, que logo eram transformadas em produtos industrializados e, sem passar por qualquer análise, desprezando-se a "espionagem" da concorrência, eram postos em mercado, ao redor de todo o mundo, saturando-o com esses produtos. Por um lado, isso em muito facilitou a vida da população da época, diminuindo o esforço e ampliando o domínio do homem sobre a natureza. Por outro, a produção era excessiva, restando muitos exemplares nas prateleiras. Daí surgiu a primeira grande crise do capitalismo, crucial para a sobrevivência desse sistema, porém pouco mencionada.
Ocorrida no final do século XIX, a primeira grande crise do capitalismo atingiu principalmente a Europa, devido ao já mencionado fenômeno de superprodução. O excesso de oferta de produtos industrializados, comparado à baixa procura, garantiu a diminuição dos preços, que nem mesmo permitiu a compra do excedente da produção. Esse processo acabou por tornar o capitalismo como se o conhece atualmente.
A produção, a partir de então, ficou cada vez mais mecanizada. Taylorismo e Fordismo comprovaram isso, sendo predominantes até os dias atuais. A produção disparada, além das técnicas de publicidade, provocando uma ideologia consumista. Os custos, logicamente, diminuíram, o que acessibilizou a aquisição dos produtos industrializados com alto grau de tecnologia embutida. Ressalta-se que antes a indústria têxtil já possuía essa capacidade, mas tinha, na época, baixo grau de tecnologia. E assim vive-se até os dias atuais. O lançamento de novos produtos gera a aquisição desses, enquanto que os antigos, muitas das vezes, acabam parando no lixo por simplesmente serem anacrônicos.
O "neo-profetismo", centrado num provável e talvez distante desastre natural em escala global, acaba entrando nessa fome de consumismo, que saiu do plano das idéias para a realidade em alguns países e, em outros, já começa a mostrar suas facetas em certas classes sociais, como contrapartida de planos de distribuição de renda, com novos produtos que pretendem "revolucionar e acabar" com o risco da humanidade ser extinta por aquela que, ao longo de milhões de anos, gerou-a. São sacolas, papéis, folhas, utensílios domésticos e outros produtos feitos com base na reciclagem.
Esse método é uma boa forma de tentar minimizar o dano que é causado à Natureza, mas não deve ser a única medida, nem considerá-la como a solução para todos os problemas atuais. O que falta é uma mudança na ideologia individual, baseada no reaproveitamento, separação dos resíduos produzidos e educação no consumo, a fim de torná-lo mais consciente. Há que se destacar também a importância de investimentos do próprio Estado nos setores de coletas seletivas regulares, tratamento adequado do esgoto e resíduos industrais e monitoramento ambiental permanente. Enquanto isso não acontece, o jeito é esperar...sentado.

No Calor da Guerra

(Colaboração do Neiva!)

Toda beleza de espírito
Toda a emoção
Toda a essência da vida
Num evento
Que por mais que sangrento
Brota (desperta) em nós
O que há de melhor

A guerra é a dor enobrecedora
A glória da vitória é o sangue do inimigo escorrido
E no chão baqueado ele se encontra
A vida se resume, logo, na morte do meu rival

A minha Liberdade é a prisão do meu próximo
A minha Igualdade é a indiferença a meu irmão
A minha Fraternidade é estraçalhar e desprezar o sofrimento do meu inimigo.
Locations of visitors to this page